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UMA OUTRA LIÇÃO INDIANA


Por Célio Juvenal Costa, professor da UEM


No meu último texto aqui nesta coluna eu fiz uma síntese de uma história que li em um livro sobre mitologia indiana. Agora vou reproduzir uma outra história, pois a considero muito significativa e, porque não, uma lição que podemos levar para a vida. É a história de um rei que teve sonhos que o deixaram inquieto e que buscou alguém, no reino, para interpretá-lo e, para isso, ofereceu recompensas. Vamos à história:

 

 

Certa vez um rei teve um sonho muito perturbador. Todos os que tentaram, do reino e de fora, decifrar o sonho não conseguiam satisfazer o rei, que, assim, ofereceu uma rica recompensa para aquele que conseguisse. Um aldeão simples, súdito daquele rei, encostado em uma árvore numa pequena floresta, sonhando com a riqueza prometida pelo rei, ouviu um pássaro que disse a ele: "se quiser que eu decifre o sonho do rei você deve dividir a riqueza comigo". Decifrado o sonho, o camponês foi correndo para o palácio, pediu para falar com o rei e revelou o significado do sonho. O rei julgou adequado e deu a recompensa ao que ele passou a considerar um sábio-adivinho. Voltando para sua casa, o matuto ficou fazendo planos de como usar a riqueza que agora possuía, mas lembrou da promessa que havia feito ao verdadeiro decifrador, o pássaro, e ficou indignado de ter que dividir seu ouro. Decidiu não cumprir o prometido e não foi atrás da ave. Ficou rico, construiu uma grande e pomposa casa, contratou criados e se casou com uma bela e esbanjosa jovem. Depois de um tempo, gastando muito mais do que ganhava, começou a empobrecer novamente, sendo quase abandonado pela sua esposa. Um dia emissários do rei foram buscá-lo pois o soberano havia tido um outro sonho enigmático. Ele, desesperado, sem conseguir decifrar o novo sonho, depois de dias e sem saber o que fazer, foi procurar novamente o pássaro, recolhendo sua vergonha. Novamente a pequena ave disse a mesma coisa, que se interpretasse o sonho o rapaz teria que dividir a fortuna. Novamente o rapaz concordou e foi correndo ao rei para comunicar o significado do sonho. O rei, como da outra vez, concordou com o rapaz e deu a ele uma recompensa ainda maior, aumentando a fama de sábio que ele já tinha. Voltando para casa, fazendo planos de recuperar e aumentar suas posses, novamente ficou indignado de ter que dividir com o pássaro tamanha riqueza; mas desta vez ele resolveu que iria matar o bichinho e, indo para a floresta, quando o avistou jogou várias pedras nele, errando, para sorte do pássaro, todas as tentativas. Voltou para casa, aumentou sua já enorme casa, contratou mais serviçais, deu mais joias para a mulher, que, com isso, continuou ao seu lado. Certo dia uma comitiva real foi procurá-lo para que novamente decifrasse um outro sonho misterioso. Como da vez anterior, ficou aflito, pois ele, definitivamente, não sabia nada da arte de interpretar os sonhos. Mais aflito ainda ficou ao saber que o rei havia dito que se não soubesse o significado do sonho, teria sua cabeça cortada. Desesperado e extremamente envergonhado foi, como último recurso, a procura do pássaro adivinhador. Novamente o bichinho de penas e asas disse que ele deveria dividir a recompensa. O pobre camponês milionário foi ao rei e, de novo, o soberano concordou com o significado e, de novo, deu uma recompensa ainda maior para o maior sábio-adivinho que ele conhecia. Desta vez, o rapaz foi até a floresta e levou a arca de ouro para o pássaro. A avezinha disse para ele que não queria aquela riqueza, pois dela não precisava para viver. E disse mais, "você é uma pessoa comum, igual a todos, você é levado pela massa sem refletir e sem se destacar, você se deixa influenciar pelo sentimento da onda, você faz, simplesmente, o que os outros fazem". E continuou: "como sei disso? Ora, o primeiro sonho revelava que havia uma atmosfera de falsidade e deslealdade no reino, e você tentou me enganar; o segundo sonho revelava que havia violência e traição, e você foi violento comigo. No terceiro, que mostrou que agora existe um clima de justiça e lealdade no reino, você veio me pagar". E arrematando, falou o pássaro: "Dali em diante, não esperei nada diferente do que aconteceu, pois raras são as criaturas que permanecem imunes ao pensamento comum e dominante. Mas, de qualquer forma, fico feliz com o desfecho de tudo".

 

Acho que a fábula é praticamente autoexplicativa. Por isso, o que resta é nos perguntar: e nós, como somos? Somos rasos de alma e de consciência e seguimos a moda, só porque todos acham bonito e prazeroso seguir alguma onda, ou conseguimos nos destacar na multidão, procurando uma autonomia de alma e de consciência? Já nos perguntamos se aquilo que gostamos é realmente fruto de uma percepção e escolhas nossas, ou seguimos o fluxo? Já nos perguntamos alguma vez se o que nos dá prazer é realmente ligado a desejos nossos ou a projeções de uma massa informe? Quanto daquilo que achamos que somos é resultado de um investimento em nossa individualidade, em nossa autonomia, e não consequência da necessidade de nos sentirmos pertencendo a um grupo, a uma coletividade que já possui valores estabelecidos?

 

Claro que as respostas a todas estas perguntas são difíceis. Claro que é mais fácil gostar do que a maioria gosta, desejar o que a maioria deseja, se sentir pertencendo a uma multidão. O problema é que o confortável aqui age no sentido de anular a individualidade e, como consequência, anular a crítica e a autocrítica e, em algum momento, o vazio vem à tona, a angústia se instala e a vida meio que perde o sentido. Não é à toa que os distúrbios emocionais são considerados hoje uma epidemia mundial. Mas, será impossível, então, responder as perguntas formuladas acima? Nunca é impossível! Mas, então, como perceber? Primeiramente, fazendo o esforço de olhar para dentro de si...

 

 

Meu Instagram: @costajuvenalcelio

 

Obs: Esta é uma versão revisada e atualizada de um texto originalmente publicado no blog: devaneioseoutrasreflexões.blogspot.com.

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