Rebeldes liderados pelo grupo radical islâmico HTS avançaram nesta quinta (5) sobre a estratégica cidade síria de Hama, bastião da ditadura de Bashar al-Assad cuja eventual queda pode colocar em risco linhas defensivas vitais para Damasco e seus aliados russos e iranianos.
Segundo o comando do grupo, cuja sigla árabe significa Organização para a Libertação do Levante, em referência ao nome histórico da região que vai da Síria ao Líbano e Israel/Palestina, seus soldados já combatem dentro da cidade.
A defesa de Hama virou prioridade para Assad depois que a surpreendente ofensiva rebelde tomou em poucos dias na semana passada Aleppo, a segunda maior cidade síria, que fica 136 km a noroeste pela estratégica rodovia M5.
Se cair, o caminho fica mais livre para os rebeldes descerem a estrada a sul: em 46 km estão em Homs e, mais 164 km, em Damasco. Por evidente, há diversas fortificações no caminho, mas a facilidade da ofensiva mostra que elas não estão tão bem guarnecidas quanto se esperava.
A imprensa estatal síria confirma os combates, mas nega que eles ocorram dentro de Hama. O Exército de Assad diz que os rebeldes estão sendo expulsos aos poucos para norte, e há relatos de bombardeios russos na região. Não há relatos independentes por ora.
A Rússia de Vladimir Putin, que desde 2015 intervém em favor de Assad na guerra, ficará numa situação bastante complexa se Hama for tomada. Há diversos postos militares russos em torno da região, que fica a meros 100 km da principal base aérea do Kremlin no Oriente Médio, Hmeimim, e a cerca de 115 km do porto de Tartus, operado por Moscou.
Nesta quinta, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse que o seu governo acompanha de perto da situação em campo na Síria e seu apoio militar a Assad não mudou. Desde que invadiu a Ucrânia em 2022, contudo, Putin redirecionou equipamento e pessoal no país árabe para o conflito europeu.
Não se sabe bem quantos militares e mercenários russos se encontram na Síria hoje. Já foram mais de 5.000 no auge das operações pró-Damasco, que garantiram o controle de 70% do país -a cruenta batalha por Aleppo em 2016 sendo seu maior símbolo.
A ofensiva rebelde foi o primeiro movimento significativo de linha de frente no conflito iniciado em 2011 desde que Rússia e Turquia, dois dos principais atores estrangeiros em campo na Síria, estabeleceram um cessar-fogo há quatro anos entre rebeldes apoiados por Ancara e a ditadura aliada de Moscou.
O arranjo não incluía inicialmente a HTS, que saiu de uma costela da rede terrorista Al Qaeda em 2016, mas o grupo esperou a conjunção de fatores: o foco russo na Ucrânia e o enfraquecimento da posição do Irã e seu preposto libanês Hezbollah, que atuavam em terra enquanto Putin dava sua maior contribuição com poder aéreo.
A guerra contra Israel, que destroçou o Hezbollah e expôs Teerã ao risco de confronto aberto com o Estado judeu, após trocas de ataques com mísseis e drones, complica os esforços da teocracia de manter a Síria sob sua influência.
Além disso, a Turquia tenta ocupar esse vácuo também, e deu apoio à HTS e outras facções de forma independente. O problemas para o presidente Recep Tayyip Erdogan é que com isso ele se indispõe tanto com Putin quanto com os EUA, que apoiam os curdos.
Esse grupo étnico, rival de Ancara que ocupa uma grande faixa no nordeste sírio, também avançou algumas casas, e está em combate com forças de Assad.
A HTS, de olho em apoio do Ocidente, tem tentado dissociar-se de seu DNA terrorista. Seu líder, Abu Mohamed al-Golani (ou al-Joulani, dependendo da transliteração adotada), disse que Aleppo será governada por uma coalizão de grupos, incluindo moderados e seculares apoiados pela Turquia.
Por ora, os EUA e países europeus têm mantido distância. O Pentágono afirmou que acompanha o desenrolar da situação com preocupação, mas mantém a classificação de terrorista daquela fatia específica dos rebeldes.
Desde 2015, o Ocidente opera uma missão comandada por Washington contra o grupo terrorista Estado Islâmico, que chegou a conquistar vastas áreas na Síria e no Iraque. A repressão deu certo, e hoje a facção opera em alguns bolsões apenas, mas os americanos mantêm cerca de 800 soldados no país, ao lado de um grupo rebelde sírio.
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