Suicídio é deserção?
O suicídio algumas vezes pode estar ligado a quadros de transtornos mentais como bipolaridade e transtorno de personalidade borderline, que aumentam significativamente os riscos de crises suicidas, frequentemente culminando no ato em si. Além disso, doenças terminais e a depressão são fatores que agravam a saúde mental, exigindo uma abordagem cuidadosa e integrada. A saúde mental deve ser tratada como um evento familiar que necessita de muita atenção, impedindo que os indivíduos lidem com suas dificuldades de maneira solitária e independente. Uma rede de apoio familiar e social robusta é essencial para que, em momentos de crise e dificuldade, especialmente quando acometidos por esses transtornos, os indivíduos sintam que não estão lutando sozinhos.
A impessoalidade da vida e o desejo de desaparecer
David Le Breton, em sua obra "Desaparecer de Si", explora o tema do suicídio a partir da perspectiva da impessoalidade e indiferença na vida. Ele discute como a sensação de não ser mais de ninguém – de desaparecer de si mesmo – permeia a existência de muitas pessoas. Le Breton aponta que, mesmo tendo filhos, muitos se sentem impessoais, desejando desaparecer no sono, buscando uma fuga da presença na vida cotidiana. A depressão é marcada por um desejo profundo de dormir e de não estar presente, alimentando-se da fadiga, do burnout, e da imersão excessiva em atividades. Essas atividades, muitas vezes, servem como uma tentativa de anulação de si mesmo, uma forma de desaparecer no outro ou nas coisas.
Crescimento e estabelecimento da crise suicida
Quando a crise suicida se instala, ela encontra terreno fértil nesses sintomas e sentimentos para crescer e se estabelecer. A sensação de impessoalidade, a indiferença, e a exaustão emocional criam um ambiente onde a ideia de desaparecer de si mesmo se torna cada vez mais atraente. É importante aqui entender que esses sintomas não surgem isoladamente, mas são interligados e exacerbados pelos transtornos mentais e pelas condições de vida. É preciso sempre se lembrar disso: suicídio é a culminação de uma crise suicida, que está ligada à vida toda - tudo o que está interligado e sendo percebido muitas vezes de uma forma até alterada ou como também podemos chamar, dismórfica, todas as relações da vida da pessoa, a família, o trabalho, os estudos, afazeres, sentimentos, visão de mundo - tudo está ao mesmo intimamente interligado e paradoxalmente fragmentado e desintegrado funciona como uma teia dando a entender à mente dessa pessoa que sofre, como se tudo pudesse fazer sentido, demonstrando assim, a fragilidade pessoal e uma saúde mental frágil, contribuindo para o fatídico auto extermínio.
A importância do suporte familiar e social
Em tempos de crise é essencial que a sociedade e a família forneçam suporte constante e incondicional. Quem está em sofrimento deve sentir que não está sozinho em sua luta. A atenção à saúde mental não deve ser um esforço solitário, mas uma responsabilidade compartilhada. Somente através de uma rede de apoio completa e integrada é que podemos ajudar essas pessoas a encontrar força e esperança em momentos de desespero.
O entendimento do suicídio, portanto, especialmente em relação aos transtornos mentais graves, requer uma abordagem que envolva toda a família e a sociedade. É necessário criar um ambiente onde as pessoas sintam que há uma luta coletiva por sua vida e bem-estar, proporcionando apoio e compreensão contínuos. Ao reconhecer a profundidade dos sentimentos de impessoalidade (fragmentação da personalidade) e desespero, podemos trabalhar juntos para prevenir que essas crises se transformem em tragédias irreversíveis.
Cada um de nós tem um papel essencial e intransferível na luta contra o suicídio. Não se trata apenas de oferecer suporte àqueles em crise, mas também de cuidar da nossa própria vida com a máxima responsabilidade e integridade, pois, nossas ações, atitudes e presença impactam profundamente todos ao nosso redor - principalmente aqueles que estão em crise suicida. Ao viver de maneira consciente e empática, fortalecemos não apenas nossa própria saúde mental, mas também contribuímos para um ambiente mais saudável e solidário para todos.
Portanto, suicídio não é deserção nem covardia, porém, é um alerta de adoecimento profundo e de rebaixamento funcional completo de alguém que está imerso em uma sombra de dor tão profunda que atesta que não consegue mais cuidar de si mesmo, para resolver seus próprios problemas. No entanto, em seu último ato, através de uma violência extrema, revela uma falibilidade tão profunda que nos choca e nos evidencia em nosso próprio sentido de humanidade que perdeu o rumo como gregários.
É imperativo assumirmos a responsabilidade pela vida – a nossa e a dos outros. Juntos, temos o poder de criar um ambiente onde ninguém se sinta isolado em sua luta, onde cada vida seja valorizada e protegida com o cuidado e respeito que merece. Agora é o momento de agir com determinação e compaixão, pois a vida de cada pessoa está interligada e depende de nosso compromisso coletivo.
Psicóloga Auriciene Lidório
Registro: CRP 08/20137 - CNES: 4598431
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Site: www.psicareweb.com.br
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