Nosso colunista Nailor Marques Junior fez um vídeo extraordinário (link para o vídeo) sobre o caminho da violência contra a mulher e a partir disso, fomos conclamados a escrever sobre isso do ponto de vista Bíblico, Teológico e Psicológico (minha esposa, Auriciene Lidório escreve sobre o tema) - Veja aqui.
O que Nailor Marques Junior fala sobre 'iter criminis' (não deixe de ver o vídeo) é muito interessante e quero me "apropriar" da sua deixa para escrever este artigo (serão CINCO partes, porque o tema renderá muito assunto, não deixe de acompanhar todo o conteúdo). Como ele diz: nada começa do nada - o pecado (crime de violência contra a mulher) não nasce com o dia, ele está sendo gestado no coração e na mente de quem o faz.
A violência contra a mulher é uma problemática global que atravessa culturas, religiões e classes sociais. Trata-se de um fenômeno complexo que pode se manifestar de diversas formas, incluindo violência física, sexual, psicológica, emocional, simbólica, moral e econômica. Estatísticas mundiais revelam a gravidade da situação: segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de uma em cada três mulheres no mundo já sofreu algum tipo de violência física ou sexual por parte de um parceiro íntimo ou violência sexual por terceiros em algum momento de suas vidas. Essa violência não apenas causa danos físicos, mas também gera consequências psicológicas e sociais duradouras.
Os cristãos de todo o mundo deveriam estar isentos de entrar nessa estatística, infelizmente não é assim. Por isso urge considerarmos o assunto do ponto de vista bíblico e teológico, para quem sabe, atingir em meio cristão àqueles e àquelas que estão de uma forma ou de outra envolvidos com o tema.
Estudar a Bíblia oferece uma lente única e profunda para compreender e enfrentar a violência contra a mulher. A Bíblia, como texto sagrado para bilhões de pessoas ao redor do mundo, contém princípios éticos, morais e espirituais que podem iluminar questões contemporâneas. Além disso, a teologia, enquanto disciplina que sistematiza e interpreta a fé e as escrituras, fornece ferramentas para uma reflexão crítica e transformadora sobre as relações humanas e a justiça social.
Para enfrentar efetivamente a violência contra a mulher, é muito importante entender suas raízes espirituais e morais.
A Bíblia descreve o pecado como uma força destrutiva que distorce a natureza humana e as relações interpessoais. Desde a queda no jardim (Gênesis 3), a humanidade passou a viver sob a influência do pecado, que introduziu a violência e a injustiça no mundo. A desobediência a Deus resultou na ruptura da harmonia original entre homem e mulher, substituindo o respeito e a igualdade por dominação e conflito. Ainda no Gênesis, vemos, como consequência imediata da queda humana o sofrimento feminino ser grandemente aumentado e um aviso de Deus de que a mulher acabaria (por conta do pecado e do mal) sendo subjugada e dominada pelo homem (Gênesis 3.16). Dá para inferir daí algo terrível: quando a relação do ser humano com seu Criador está comprometida, as relações humanas também se deterioram. A falta de comunhão com Deus leva à perda de valores divinos essenciais, como o amor, o respeito e a dignidade.
O distanciamento dos princípios divinos de amor e respeito está no cerne da violência contra a mulher. A Bíblia ensina que o amor ao próximo é o segundo maior mandamento (Mateus 22:39), e que homens e mulheres são igualmente criados à imagem de Deus (Gênesis 1.27). Quando esses princípios são ignorados, surgem comportamentos abusivos e desrespeitosos. A violência contra a mulher deve ser vista como uma manifestação do pecado estrutural (a queda transformou toda a estrutura até então perfeita em defeituosa) e pessoal (com consequências imediatas, ao longo do tempo e eternas).
Voltando ao que nosso colunista Nailor fala, o conceito de "iter criminis", ou "caminho do crime", do Direito Penal, descreve as fases pelas quais passa a execução de um crime, desde a sua concepção até a sua consumação. Aplicando ao nosso contexto bíblico e teológico, vamos pensar nas fases do "iter criminis" (Cogitação, Preparação, Execução, Consumação e acrescento o Exaurimento – não há consenso desta última fase entre juristas, mas ela se aplica muito bem ao nosso contexto), pois afinal, violência contra a mulher é um crime (contra a mulher) é também um crime contra Deus (que nos criou à sua imagem e semelhança) e um crime contra a família e sociedade (que sofrem as consequências nefastas de tais atos).
A violência contra mulheres não é apenas um ato violento – isso é um fato – mas é uma engendrada elaboração do mal, desde a estrutura humana corrompida pela queda por causa do pecado até as atitudes humanas individuais.
A grande causa da violência contra mulheres é encontrada no machismo estrutural. O machismo estrutural é fruto dessa queda. Isso não é uma invenção política contemporânea, mas é uma constatação do domínio e poder exercido pelos homens ao longo da história, massacrando, subjugando, espoliando, maltratando, objetificando e violentando mulheres em todas as culturas, épocas e situações.
Privilégio e poder são as palavras de ordem da cultura humana e esses são (ou foram sempre) exercidos pelos homens com a desculpa de que isso é bíblico, referenciando-se à fala de Gênesis que diz que após a queda a mulher seria dominada pelo homem (Gênesis 3.16). A cultura humana idealiza como “ordem natural” a mulher ser dominada e, portanto, subjugada e tratada como um “bem”, um objeto do homem.
Não sei se você já pensou sobre isso, mas Deus não nos criou (homem e mulher) para sermos subjugados, maltratados, corrompidos, violentados e massacrados. Ele não nos criou para o pecado. Ela não nos fez para a morte. Ele nos fez à sua imagem e semelhança – homem e mulher e não somente o homem.
Ele criou tudo perfeito – “E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom” (Gênesis 1.31).
A queda estragou tudo. A queda nos colocou em situação de desvantagem e tanto o homem como a mulher foram afetados diretamente pelo pecado; tornaram-se corrompidos de corpo, alma e coração. O homem, por causa disso, apropriou-se do poder e do domínio não para cuidar da criação, mas para explorar, usar e descartar quando desejasse. As estruturas humanas criadas a partir da queda TODAS foram corrompidas – o trabalho, a cultura, a família, os relacionamentos, a sexualidade, o culto, os negócios, a economia – ou seja, não há nenhuma obra humana isenta da queda e tudo o que surge, surgiu ou surgirá sobre a face da terra foi tocado pelo pecado e é corrompido.
Pensando nisso, podemos imaginar que o engendramento da violência não começa no ato violento, mas na elaboração das estruturas do mal, do mal estrutural que permeia todas as nossas obras – e essa elaboração tem começo, meio, fim e consequências. Vamos ver mais disso na parte 2 desse artigo.
Até lá.
Recomendo fortemente a leitura de “Uma igreja chamada TOV” (clique aqui)
Pr. Gedeon Lidório
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E-mail: gedeon@lidorio.com.br
Site: www.teoeduca.com.br
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