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O estranho país que cobra a fatura das injustiças sociais exatamente dos menos favorecidos.

Por Walber Guimarães Junior, engenheiro e diretor da CIA FM.


É um trauma muito comum para o brasileiro; termina o salário e ainda tem mês pela frente. Antes do plano real, a grande vilã era a inflação que corroía diariamente o poder de compra dos salários e, os mais velhos ainda se recordam, era necessário escolher até o dia das compras mensais, alguns, mais detalhistas, escolhiam até o início da manhã para conseguir encher o carrinho antes da fúria remarcadora do exército de funcionários contratados especificamente para esta atividade.



Um pesadelo que assombrava a população brasileira e que agora tem os fatores da equação invertidos; é o Brasil que vê a cada ano, sobrarem menos dias depois do pagamento da parcela de juros da dívida pública, como agora em 2024 que só no final de setembro cumprimos este doloroso compromisso, sem sinal de redução relevante nos montantes da dívida, todavia com motivos completamente diferentes.


Se a população antes era vítima do descontrole dos parâmetros da economia, cujos desacertos resultavam em inflação galopante, por conta da incapacidade do governo de reverter a situação, porque a bíblia da economia do regime militar apontava para a necessidade de crescer o bolo, tamanho da economia, para, só depois, dividi-lo em benefícios para o cidadão. A cartilha perfeita para gerar o país mais injusto do mundo, onde 1% do topo da pirâmide tem mais riquezas que metade da população.


Deplorável? Sem dúvidas, se a resposta vier de alguém com sensibilidade social. Mas tentar resgatar a dívida social com a população de baixa renda, sem um processo gradual, que imponha como limites a capacidade financeira da nação parece também ser inconcebível, ainda que o presidente Lula indique que o combate à miséria não pode respeitar limites e precisa, inclusive, superar os tetos de gastos públicos, ampliando o nosso rombo fiscal.


Com simplificações excessivas, ainda assim acredito que todos possam perceber a complexidade da discussão do atual debate. Assistimos um crescimento perigoso do nosso déficit fiscal este ano, que já em outubro superava os valores de 2023, com a justificativa de imensos custos da máquina assistencialistas do governo federal, não só por isso, óbvio.


Ainda que o governo fale em “apenas” 76%, é possível que no fim deste ano a dívida pública atinja 80% do PIB, nível de endividamento preocupante porque crescente e sem merecer, até agora, a devida atenção, ainda que em ações paliativas. Virou regra geral, acentuada no governo Lula; se tem déficit fiscal, a solução precisa ser aumento de arrecadação, que também se traduz por aumento de impostos.


Lógico que o problema é muito grave, mas preciso registrar que a solução recorrente é muito cruel; todos sabem que o andar de baixo, na escala social, é muito mais penalizado que a classe rica por não ter mecanismos para se proteger da gana arrecadadora do governo. Na prática, os pobres pagam muito mais impostos, piorando sua já precária qualidade de vida, pela inexplicável equação que coloca os menos favorecidos para pagar a conta das injustiças sociais, da qual são as grandes vítimas.


As nossas estruturas de poder, desde a era colonial, estão organizadas para proteger a elite econômica e política, na prática um único grupo homogêneo e com baixa permeabilidade, e, por isso, todas as mazelas da administração pública tem uma perversa convergência; protegem as elites e penalizam os mais carentes e qualquer tentativa de reverter este quadro sofre intenso ataque coordenado daqueles que desejam, e precisam, da manutenção do status quo.


Respeitando os limites da tua paciência, recorro a um único exemplo, o imposto sobre as grandes riquezas implicaria em arrecadação estimada em 260 bilhões de reais, equivalente a dois anos e meio de rombo fiscal, valores suficientes para manutenção das bolsas, sobre as quais também omito um debate mais amplo, por simplificação textual, permitindo impulso nas ações efetivas de resgate social, talvez evoluindo das medidas de combate à fome para ações concretas de viabilidade de melhoria cultural, qualificação profissional que poderiam, no curto prazo, resultar em mais qualidade de vida e crescimento da renda das famílias.


Acredito que a sociedade brasileira precisa aprofundar o debate desta pauta, sem carimbos ideológicos, em arroubos retóricos apontando para ideologias extremas, mas focada no alcance social e humanitário da questão.


Estou certo que seria muito mais saudável, com mais possibilidade de indicar caminhos para o desenvolvimento do que a irritante cultura nacional de, alternadamente, transformar os ícones das pontas ideológicas em “geni” da nossa política.


Pouco importa qual é melhor ou pior entre Lula e Bolsonaro, mas quem está efetivamente em condições de nos liderar para enfrentar os reais desafios para resgatar nossa dívida social sem comprometer nosso caminho rumo ao desenvolvimento.


O Brasil do menos ruim nos leva à situação “menos pior”, por isso é hora de buscar por ideias e projetos que nos permitam vislumbrar o melhor para a nação.

 

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