Por: Célio Juvenal Costa, professor da UEM
Como todos sabemos o individualismo é uma das marcas de nossa sociedade. Nada há nisso de novidade. Enquanto a sociedade se organizar da forma como está, ele, o individualismo, vai ser uma prática hegemônica na sociedade. Confesso que isso nem me incomoda mais como me incomodava há alguns anos atrás. Deixei, há algum tempo, de ser idealista ingênuo de achar que as pessoas tomariam consciência da necessidade de se pensar no coletivo e seriam menos egoístas. Nem mesmo durante a última pandemia, em que era comum ouvirmos e lermos que era uma chance de as pessoas melhorarem e pensarem mais nos outros, eu acreditava que isso iria acontecer, como de fato não aconteceu. Mas isso fica para um próximo texto.
No entanto, apesar disso, algumas coisas que fazem parte de nossa vida precisam ser resolvidas, e isso, a meu ver, pode ocorrer sem, necessariamente, ferir a prática individualista. Ou seja, estou pensando ultimamente que podemos avançar em algumas relações sociais continuando e preservando o individualismo nosso de cada dia.
Penso especialmente no trânsito. Não preciso nem discutir muito e nem apresentar muitos exemplos de como os motoristas em geral não pensam nos outros motoristas, ou nos pedestres, ou nos ciclistas. O não parar na faixa de pedestres, o bloquear cruzamentos, o trafegar no meio da rua em que cabe dois carros, o parar em fila dupla, o parar na sombra mesmo o semáforo estar a 30 metros etc., revelam atitudes egoístas e individualistas em que os outros, de fato, não são importantes, os outros são até desprezíveis por serem obstáculos para a pretendia rapidez no trânsito. O trânsito é, na minha opinião, o terreno em que as atitudes individualistas são mais visíveis e marcantes, tanto que parece absolutamente não resolver nada as campanhas educativas que volta e meia se fazem presentes. Se simplesmente as campanhas educacionais fossem efetivas, os problemas de nosso trânsito já teriam sido resolvidos, as crianças andariam nos carros em cadeirinhas próprias... e assim por diante. Mas o fato é que o dinheiro público gasto em campanhas parece um recurso mal aplicado...
Por isso que eu acho que se fôssemos mais francos e diretos e não querer dissimular as coisas, talvez os resultados fossem mais positivos. Por exemplo, os motoristas não precisam ser altruístas e pensar nos outros, que fiquem pensando em seus próprios umbigos, mas sejam mais radicais, pois poderiam simplesmente pensar que eles próprios em um outro dia, no futuro, estarão andando a pé, ou estarão andando de bicicleta, ou estarão bloqueados em algum cruzamento, ou seja, em algum momento eles também serão prejudicados e, portanto, seguir as regras do trânsito pode, sim, significar manter intocado o individualismo nosso de cada rua... Se ser individualista é pensar somente em si, se lixando para as necessidades dos outros, ora, o que custa fazer isso numa dimensão mais futura (tanto próxima como distante), pensar em si mesmo nos benefícios que se quer ter no futuro, benefícios que se traduzem no fato de os outros não atrapalharem a sua vida.
Eu continuo pensando, cada vez com bem menos entusiasmo, em uma sociedade que o coletivo seja mais importante que o individual, no entanto, na realidade em que vivemos, na disputa que temos todos os dias no trânsito, sejamos, então, individualistas. Pensemos, portanto, num tipo específico de individualismo, o de resultados. Talvez a saída para que os outros sejam respeitados esteja, contraditoriamente, na essência mesma da sociedade consumista, como uma espécie de pacto em que se garante o egoísmo de todos, sem restrições, pois todos são, ou têm potencial de ser, consumidores, ops, quer dizer, motoristas... E se for assim, saúdo o individualismo de resultados!
Meu Instagram: @costajuvenalcelio
Obs: Esta é uma versão revisada e atualizada de um texto originalmente publicado no blog: devaneioseoutrasreflexões.blogspot.com.
Comments