Por: Célio Juvenal Costa - Professor da UEM
A Organização Mundial da Saúde (OMS), órgão ligado à ONU, divulgou em 2022 o Informe Mundial de Saúde Mental, no qual afirma que em 2019 quase 1 bilhão de pessoas no mundo sofriam de algum tipo de transtorno mental. Por saúde mental, a própria OMS o define como "um estado de bem-estar onde o indivíduo realiza suas próprias habilidades, lida com os fatores estressantes normais da vida, trabalha produtivamente e é capaz de contribuir com a sociedade". A doença mais frequente é a depressão, caracterizada por tristeza, perda de interesse, ausência de prazer, oscilações entre sentimentos de culpa e baixa autoestima, além de distúrbios do sono e do apetite e, também, uma contínua sensação de cansaço e falta de concentração. É, no mínimo, curioso constatar-se que hoje se vive uma busca incessante por felicidade ao mesmo tempo que a infelicidade atinge cada vez mais pessoas.
A felicidade hoje em dia parece ser definida como quantidade de prazer, ou seja, quanto mais prazer se consegue ter, mais feliz se é. Mas, o prazer numa sociedade consumista como a nossa necessita de dinheiro para satisfazê-lo e, assim, quanto mais dinheiro, mais prazer e mais felicidade; resumindo: dinheiro igual a felicidade. Numa sociedade como a nossa tal equação é naturalizada, aliás, desconfio de que na maioria das sociedades ao longo da história, riqueza significou, na opinião comum, felicidade. E o que que é característico também da nossa sociedade, e que está no centro da dicotomia felicidade/infelicidade é o fato de que as pessoas, no geral, estão muito carentes.
Carência de carinho, carência de atenção, de amizade, de amor, de sexo, de religião, de coisas materiais, enfim, carência de sentido da vida. Como as carências mais profundas são cada vez mais difíceis de entender e de preencher dado o individualismo e o egocentrismo cada vez mais profundos, tenta-se, desesperadamente (se bem que na grande maioria das vezes, de forma inconsciente), suprir as carências com coisas. Eu sempre penso, neste caso, no exemplo do celular, pois cada dia o mercado lança um aparelho novo com novidades e design mais moderno, o que resulta num mecanismo psicológico de criação da necessidade do novo celular, mesmo que o que temos já seja suprido de todos os mecanismos atuais. A novidade no mercado (de variados produtos) cria a carência daquilo e a sua correspondente necessidade e, sem se dar conta de tal mecanismo, colocamos a nossa felicidade na sua aquisição; é uma roda sem fim...
Penso que boa parte da relação entre as pessoas também passa pelo mesmo mecanismo de preenchimento dos vazios das carências. Como a lógica social e econômica passa pela propriedade e posse de coisas, a relação entre as pessoas acaba passando, também, pelo sentimento de posse, de propriedade do outro. Mas, da mesma forma que a propriedade das coisas acaba por não preencher as carências, pois a necessidade de mais coisas tem que ser sempre instigada, é uma forma ilusória de felicidade pensar em ter o domínio do outro. Penso sempre, neste caso, no ciúme, especialmente daquele mais neurótico. O ciumento se sente feliz por ter a pessoa amada, mas é um eterno sofredor, por desconfiar sempre que a outra pessoa o está traindo; o ciumento quer controlar a outra pessoa, especialmente por meio das chantagens emocionais, e isso desencadeia um processo que é marcado mais pelo sofrimento do que pela felicidade, pois sofrer por fantasmas criados pode ser mais cruel e mais profundo.
O que está na base de todo prazer/sofrimento tão característico de nossa sociedade é, na minha opinião, o sentimento absolutamente individual e individualista que vivemos hoje. Começa-se só e se termina só, mesmo que acompanhado. As coisas são volúveis, as relações são volúveis e o que sobra é a sensação profunda e dramática da solidão. A busca incessante, busca neurótica pelo outro, é uma busca desesperada por nós mesmos; como não nos encontramos no outro, perdemos a nós mesmos!!!!
É claro que isso não se aplica a todas as pessoas felizmente, pois há quem consiga manter sua individualidade sem perder-se no outro ou nas coisas, e assim, saboreia por mais tempo o estado que chamamos de felicidade. No entanto, tenho a convicção de que a busca quase frenética pelo prazer que resulta no estado de infelicidade, de sofrimento, é uma forte marca da atualidade.
Meu Instagram: @costajuvenalcelio
Obs: Esta é uma versão revisada e atualizada de um texto originalmente publicado no blog: devaneioseoutrasreflexões.blogspot.com.
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