Por Walber Guimarães Junior, engenheiro e comunicador.

O batom levantado por Michele Bolsonaro nas últimas manifestações pode ser muito mais que o símbolo da luta pela anistia dos condenados de 8 de janeiro, bastando que observadores atentos verifiquem os dados finais das eleições de 2022.

Ainda que o segundo turno tenha registrado um equilíbrio intenso entre Lula e Bolsonaro, é fácil perceber que foram alguns segmentos que construíram a diferença a favor do petista. Nordestinos, onde as estimativas apontam que Lula ficou próximo de 68%, eleitores com renda até dois salários-mínimos, onde as pesquisas indicavam 56% de preferência por Lula e, atentem para isto, no eleitorado feminino, onde Lula obteve quase 58% dos votos, exatamente por ser o gênero onde a rejeição à Bolsonaro era mais consistente, sustentada pelas pautas da disputa eleitoral.

Uma estratégia eleitoral bem elaborada precisa enfrentar as resistências nestes três segmentos com inteligência e se valendo de todas as possibilidades possíveis, mas, sendo realistas, não há uma ação isolada que se mostre eficiente para este enfrentamento, como vamos tentar discutir a seguir;

O Nordeste parece o reduto mais resistente do petista, onde enfrenta apenas lideranças regionais na ponta direita, sendo Ciro Gomes, de centro esquerda, o nome mais relevante eleitoralmente, e parece improvável imaginar qualquer composição entre Ciro e a direita, sendo razoável supor que qualquer outro nome nordestino para compor a chapa, produzirá apenas efeitos locais, não impactando nos demais estados, sendo o desgaste de Lula, no exercício do poder, a arma mais significativa para equilibrar o jogo.

Em relação ao eleitorado de baixa renda, centro das atenções do governo Lula, alvo dos principais programas assistencialistas do governo, é importante perceber que quem tem a caneta, preserva sempre a capacidade de contemplar este público com indulgências ou ações significativas, sendo muito mais complexo imaginar as formas da oposição interferir neste público, logo a melhor aposta é o desgaste do governo, inevitável se a economia entrar em declínio, situação em que a transferência de votos é bastante previsível, portanto a desagradável necessidade de torcer contra o governo, e isto é também torcer contra o país, é a hipótese mais plausível.

Resta o público feminino, onde a rejeição pessoal ao Jair Bolsonaro foi o principal fator para explicar o “spread” eleitoral, com algo entre 6 e 8% de majoração em comparação com o resultado do segundo turno. Observe que cada ponto percentual representa algo entre 1,2 e 1,5 milhões de votos, é justo supor que empatando o jogo no voto feminino, Bolsonaro teria vencido as eleições, assim como isto pode se repetir em 2026.

A etapa seguinte que lhes proponho é a avaliação das alternativas disponíveis à direita; os governadores Tarcísio de Freitas, Ratinho Junior, Ronaldo Caiado e Romeu Zema, me restringindo aos mais expressivos eleitoralmente neste momento, todos com perfil de votos, verificáveis pelas pesquisas disponíveis, muito próximas do eleitorado de Jair, também com limitações flagrantes nos segmentos supramencionados. Nada que permitisse um otimismo significativo.

Mas, por conta de outra bandeira da direita, a luta pela anistia que colocou em cena algo inusitado que gera um belo alento ao eleitor da direita. A escolha de Débora, a mulher que pichou a estátua da justiça, na Praça dos Três Poderes com a frase “perdeu mané”, com provável condenação por catorze anos, escolhida como símbolo da luta pela anulação das penas, ou pelo mesmo da revisão da dosimetria das penas que gerou um surpreendente fato novo, a união de dois símbolos essencialmente femininos, a manicure e o batom, ambos associados com maestria pelo marketing à luta pela injustiça e, em segundo plano ao receituário da direita.

Ainda que os números apontem que cada vez mais brasileiros ache justa a condenação de Bolsonaro, também sobe o nível de indignação com as penas exageradas dos do 8 de janeiro, ainda que as penas estejam restritas a apenas 20% dos envolvidos na ação, metade deles com penas de até três anos e os restantes, pouco mais de cem pessoas, com penas altas. Todavia, bastaria um único caso para despertar a reação daqueles que a julgam injustas.

São estas variáveis, em conjunto, que vão escalando Michele Bolsonaro no centro do tabuleiro, sendo, desde já, a mais competitiva opção da direita por somar integralmente o espólio eleitoral do seu marido e vislumbrar a possibilidade de números muito expressivos em dois segmentos com potencial para definir o pleito; o voto feminino e o voto evangélico, espaços onde avança mais até que Bolsonaro e pode gerar gordura suficiente para derrotar Lula.

Ainda que sem habilidade para o jogo político, demonstrando emoções e reações que normalmente os homens controlam, Michele pode ser o caminho perfeito para preservar o bolsonarismo, pauta de costumes na mão, como alternativa mais viável para 2026.

Prepare-se porque, o marketing já desenhou cada variável que descrevo acima e, embora não interfira no jogo dos bastidores, pode entregar números que nenhuma outra dobradinha parece capaz de oferecer.

Que dobradinha? Michele e o batom. Sim, isto mesmo, Michele Bolsonaro, de batom nas mãos, como a possibilidade mais real de devolver o poder à direita, segundo a leitura mais recente.