Por Walber Guimarães Junior, engenheiro e comunicador.
Acredito que seja um dos mais belos capítulos da mitologia grega, a lenda dos Andróginos, que nos informa que, no início, todo ser humano tinha uma forma diferente, algo como dois corpos contrapostos, com quatro mãos e quatro pés que tinham uma agilidade absurda, podendo andar ou simplesmente rolar em alta velocidade.
Eram tão ágeis que poderiam contestar o domínio dos deuses e, com este receio, Zeus decidiu cindi-los com uma espada, em duas partes, homem e mulher, foram ainda cicatrizados no umbigo, tiveram suas faces viradas para o mesmo lado e forma espalhados pela Terra. Assumindo a nova forma, tal como somos hoje, persistiu uma intensa sensação de vazio, como se faltasse sempre a outra metade que exigiu que o ser humano dedicasse a maior parte de suas energias em busca de suas metades perfeitas.
Mesmo antes de encontrá-la, todos sentiam algo como uma enorme saudade pela sensação de que sem a nossa metade seríamos incompletos. Talvez, você seja apenas mais um ser humano que guarda em algum arquivo perdido na mente, o passado andrógino que nos impele, com frequência em direção à nossa metade, algo como uma força gravitacional ou magnética, mais bem definida com o nome de amor.
A procura é intensa, mas pode resultar infrutífera me planetinha redondo e enorme, mas, felizmente, muitos “encaixes” não tão perfeitos acabam resultando em ótimas parcerias, multiplicando o número de casais felizes, além daqueles que tentam várias vezes ...
Existem vestígios que nos facilitem o trabalho de encontrar o par perfeito? Sim, claro, e muito evidentes. Atração física, empatia, o cheiro, o sex appeal que, algumas vezes, são tão fortes que geram aquilo que batizamos de “amor à primeira vista”, pode também ser uma construção gradual, de conhecimento e reconhecimento, de identificar e criar afinidades, cultivadas naquele período que chamamos de namoro (acho que isso é um termo que nem virou o século).
Mas existe uma missão ainda mais difícil; persistir em uma união, uma vida em parceria, que sempre exige concessões, renúncias e, principalmente compreensão. Ninguém ainda concebeu uma fórmula definitiva, mas a experiência me permite listar ingredientes fundamentais para que as forças, a coragem e todos os demais itens que, em conjunto, formam aquilo que chamamos de amor.
Compreensão, carinho, admiração e desejo! Sem elas, em doses razoáveis, a união será sempre um sacrifício e, cultivá-las, a cada dia, também é uma grande missão que só é cumprida porque tem uma tal de felicidade que tem tudo a ver com esta rotina, estressante, mas terrivelmente compensadora.
Retornando à mitologia grega, lembre-se que os andróginos tinham faces opostas e, por isso, não se viam nunca, talvez isto explique a intensa necessidade de olhar todo dia e toda a hora para o nosso “encaixe perfeito”. A explicação, porém, é bem simples; tudo isto funciona como uma roda viva que gira incessantemente e, não tenho dúvida disto, o grande combustível é a troca de olhares e de sorrisos. Se mantivermos a capacidade de olhar, todos os dias, sorrir com os lábios e com a alma, seremos sempre capazes de seguir em frente, levando no coração a tal felicidade.
Por que um cara que fala de política, de repente, solta um texto cheio de sentimentos assim? Porque sou cara de muita sorte e, em um acaso do destino, encontrou sua alma gêmea em dia perdido no início de março, lá na longínqua Colatina e desde então entendeu o sentido da vida.
Preciso confessar que a relação nem chega a ser equilibrada, recebo muito mais que minha limitada capacidade de entrega. Erro, recomeço, tenho limitações significativas, mas tento compensar com aqueles ingredientes fundamentais que os entrego em abundância. Repetindo a receita; compreensão, carinho, admiração e desejo.
Sempre. Cada vez com mais intensidade.
Neste dia 15 de dezembro, completo quarenta anos de união com Ana Beatriz, a minha deusa grega para sempre.
Peço licença aos queridos leitores para, neste espaço, reverenciá-la e agradecer por receber tão pouco e me devolver com a essência de nossas vidas; muita felicidade.
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