China e Rússia têm impulsionado uma nova rodada de expansão do Brics que pode aprofundar o viés anti-Ocidente do bloco e que tem entre os candidatos latino-americanos países vistos como problemáticos pelo governo Lula (PT).
O plano de Moscou e Pequim é anunciar na cúpula de Kazan (Rússia), em outubro, um grupo de Estados que se associariam como parceiros do Brics. O status deve ser inferior ao de um membro pleno, mas a ideia é que indique um primeiro passo para a futura efetivação. De acordo com interlocutores, até dez novos parceiros podem ser anunciados na cúpula.
O Itamaraty é historicamente contrário à ampliação do Brics, grupo originalmente formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Em 2023, foi voto vencido e acabou obrigado a aceitar a incorporação de cinco novos integrantes: Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã.
A Argentina também foi anunciada na ocasião como novo integrante, mas Javier Milei cancelou a entrada de seu país no agrupamento assim que chegou ao poder.
Neste ano, a lista de candidatos a parceiros é vista como problemática pelo governo Lula, principalmente por incluir Venezuela e Nicarágua.
O petista tem sido cobrado pelo histórico de proximidade com Nicolás Maduro. O ditador foi proclamado vencedor nas últimas eleições venezuelanas por autoridades eleitorais ligadas ao chavismo, mas o pleito teve denúncias de irregularidades e de fraude. Enquanto Rússia e China prontamente parabenizaram Maduro pela vitória, líderes nas Américas têm cobrado a divulgação das atas eleitorais -alguns reconheceram a vitória do opositor Edmundo González.
Diante do recrudescimento da repressão do regime, Lula tem calibrado o discurso e fez críticas a Maduro. Na mais recente delas, disse que o governo na Venezuela não configura uma ditadura, mas um "regime muito desagradável" que tem um "viés autoritário".
O caso da Nicarágua é considerado ainda mais complicado. Depois de meses de relações congeladas, o regime de Daniel Ortega -outro ex-aliado de Lula- expulsou o embaixador brasileiro de Manágua. O governo brasileiro fez o mesmo com a embaixadora nicaraguense em Brasília. Ortega então disse que Lula tenta ser um "representante dos ianques na América Latina" e se tornou "um puxa-saco".
É bastante provável que o Brasil vetará o ingresso da Nicarágua como parceiro do Brics, devido às declarações de Ortega sobre Lula, de acordo com interlocutores ouvidos pela reportagem.
Já a Venezuela é um caso considerado mais complexo, e ainda não há definição sobre qual será a posição do Brasil. Apesar disso, assessores de Lula pontuam que é indesejado qualquer sinal visto como concessão a Caracas, no momento em que o Brasília não reconhece a vitória de Maduro e cobra a divulgação de atas eleitorais.
Diante do quadro, a diplomacia brasileira traçou uma estratégia para tentar contornar a pressão da Rússia e da China. A principal aposta do Itamaraty é a Índia, também historicamente refratária à ampliação do Brics.
Representantes de Brasil e Índia têm conversado sobre o tema. O discurso dos dois governos é que o foco dos membros do bloco deve ser a definição dos critérios dos novos parceiros: de que tipo de reuniões e grupos de trabalho eles poderiam participar, por exemplo.
Além de Venezuela e Nicarágua, também são candidatos Belarus (aliada da Rússia na Guerra da Ucrânia), Bolívia, Cuba, Honduras, Marrocos, Paquistão, Palestina e Vietnã, entre outros.
Outra estratégia da diplomacia brasileira tem sido advogar por candidatos que não possam ser taxados de antiamericanos ou antiocidentais.
Uma das preocupações levantadas por pessoas a par das discussões é justamente que a eventual entrada de parceiros que antagonizam com os Estados Unidos leve o agrupamento a ser visto como uma aliança política liderada pela China e contrária a Washington.
Nesse sentido, o governo Lula vê com bons olhos a postulação de países do Sudeste Asiático, como Tailândia, Vietnã e Malásia.
Também nessa linha, havia uma expectativa entre auxiliares de Lula de que a Colômbia apresentasse sua candidatura. O possível ingresso como parceiro do país governado por Gustavo Petro era visto como uma forma de balancear os os candidatos latino-americanos, todos alinhados ao movimento bolivarianista.
No entanto, embora Lula tenha convidado Petro a se juntar ao Brics durante visita a Bogotá em abril, a Colômbia não formalizou até o momento nenhum pedido para ser parceira do bloco.
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