Somos uma quadrilha! Quatro amigas aposentadas, ninhos vazios, menopausa, rugas e montanhas de vivências. E, ainda temos muitos planos. Muitos “corres” e “rolês”. Alguns são publicáveis, outros apenas murmuramos.
Noite dessas, sonhei que ocupamos uma praça pública. Não se tratava de nenhuma manifestação política (já participamos de muitas). As quatro idosas ocuparam os bancos da praça e ficaram lá, sentadas, olhando e ouvindo os pássaros, jogando dama, baralho, resolvendo palavras cruzadas, dando milho aos pombos ou apenas jogando conversa fora. Nada de levar netos para brincar no parquinho. O plano era exercer o ócio publicamente.
Tenho lido e refletido muito sobre o envelhecimento feminino. E comecei a fazê-lo bem antes de completar 60 anos. Já escrevi sobre como a desigualdade social e de gênero atravessam o modo como essa fase é experimentada. Porém, nunca tinha parado para pensar sobre como as praças públicas também expressam essas desigualdades.
Sabemos que as cidades não são apenas o
conjunto das edificações, das ruas, carros e multidões. A forma como as cidades são ocupadas revela modos de viver, de pensar e de sentir a dimensão humana. Revelam, também, as relações de poder, de classe e de gênero.
Como ainda somos uma sociedade marcada pelo patriarcado (apesar dos avanços), os espaços públicos das cidades acabam sendo muito mais masculinos. As mulheres sempre ficaram mais reservadas aos espaços privados. Basta observarmos o número de mulheres na política.
Tenho me perguntado também onde estão as mulheres idosas de classe social menos favorecidas? Geralmente, estão em casa, envolvidas nos afazeres domésticos, no cuidado dos netos ou dos adoecidos da família. Quando vão às praças, é para levarem os netos para brincar nos parquinhos.
Mulheres idosas com situação financeira mais favorável exercem o ócio de outras maneiras: cinema, teatro, shows, shopping, viagens...
Minha quadrilha quer que todas as mulheres possam exercer o ócio publicamente, nas praças ou em qualquer lugar. Para isso, é preciso não apenas lutar contra o patriarcado; mas também pressionar o poder público para que as praças sejam mais amigas de todas as mulheres, incluindo as idosas. Isso significa não apenas uma infraestrutura mais adequada, mas também mais segurança. Afinal, todos temos direito à cidade
A praça também é nossa!
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