O IBGE apresenta no Censo Demográfico a categoria “Mulher, sem cônjuge e com filhos”, mas não existe a categoria “Homens, sem cônjuge e com filhos”. Esse é mais um dado que reflete o crescimento assustador do abandono paterno. No Brasil, uma em cada três crianças possui apenas a filiação materna em seus documentos. A dimensão alcançada por tal fenômeno faz com que ele saia da esfera privada e transforme-se num problema social.
Esse problema tem se agravado em decorrência da crise econômica, do conservadorismo social, do patriarcado e do sexismo. Prevalece a cultura de que o sexo masculino é superior ao feminino. Só que essa hierarquização de gênero sobrecarrega muito mais a mulher, obrigando-a a cuidar das tarefas domésticas e dos filhos, ao mesmo tempo em que trabalha fora de casa. Já os homens, são protegidos por essa estrutura. A consequência dessa cultura é que a paternidade é uma opção enquanto a maternidade é compulsória. E é essa situação que possibilita que tantos homens fujam da responsabilidade de, por exemplo, registrar um filho. A desigualdade de gênero condena as mulheres à maternidade, enquanto os pais conseguem escapar da paternidade indesejada.
A maternidade solteira voluntária difere da maternidade solo involuntária porque na primeira a figura paterna é excluída dos laços da parentalidade por escolha. Normalmente, essas mulheres possuem recursos financeiros suficientes para manter de forma satisfatória um lar monoparental. Mas essa não é uma alternativa para as mães solo involuntárias, mais comuns entre as mulheres pobres. Há uma grande correlação entre a taxa de nascimentos ocorridos fora do casamento e os indicadores de pobreza e privação social. Ou seja, há mais mães solo economicamente vulneráveis. Essas mulheres, que repentinamente se vêem mães sozinhas, muitas vezes são obrigadas a alterar totalmente seus projetos de vida, suas trajetórias escolares e seus projetos profissionais. Abandonam a escola, são demitidas ou não conseguem solidificar uma carreira.
Uma das situações que colabora para o aumento da deserção paterna é o mito do amor materno que impõe a ideia de que esse tipo de amor, o materno, já nasceria com a mulher; como se a maternidade fosse apenas um fato biológico e não social. Outro fator reside no fato de que, como os homens são criados para que tenham personalidade agressiva, virilidade e força - enquanto as mulheres são educadas para serem meigas e cuidadoras - quando os homens exercem a paternidade e cuidam de um filho, eles acabam entrando em conflito com o tipo de masculinidade que lhes foi ensinada socialmente.
É fundamental a superação da misoginia, do sexismo e do controle da sexualidade das mulheres. Caso esse contexto não sofra alterações continuaremos a ver muitas mães solo e filhos sem o nome do pai no registro de nascimento. Para desconstruir a cultura da deserção paterna é preciso, então, diminuir a idealização da maternidade para colaborar com a aproximação de uma paternidade responsável e participativa; não naturalizar o comportamento do abandono paterno e educar os homens para que participem dos cuidados dos seus filhos e que tenham efetivamente uma relação afetiva com eles. O Estado deve dar amparo para que as mães solo possam contar com estrutura para cuidar dos seus filhos e equiparar a licença maternidade à paternidade.
PS: No dia dos pais divulgue esse texto para os homens que você conhece. É uma forma de ajudar na mudança desse absurdo cenário da deserção paterna.
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